terça-feira, 16 de novembro de 2010

saudade (por miguel falabella)



“trancar o dedo numa porta dói. bater com o queixo no chão dói.
torcer o tornozelo dói. um tapa, um soco, um pontapé, doem.
dói bater a cabeça na quina da mesa,dói morder a língua,
dói cólica, cárie e pedra no rim mas, o que mais dói, é a saudade.
saudade de um irmão que mora longe, de uma cachoeira da infância, de um filho que estuda fora, do gosto de uma fruta que não se encontra mais...
saudade do pai que morreu, do amigo imaginário que nunca existiu. saudade de uma cidade. saudade da gente mesmo, que o tempo não perdoa... doem essas saudades todas.
mas a saudade mais dolorida é a saudade de quem se ama.
saudade da pele, do cheiro, dos beijos. saudade da presença, e até da ausência consentida.
você podia ficar na sala e ele no quarto, sem se verem, mas sabiam-se lá.
você podia ir para o dentista e ele para a faculdade, mas sabiam-se onde.
você podia ficar o dia sem vê-lo, ele o dia sem vê-lo, mas sabiam-se amanhã.
contudo, quando o amor de um acaba, ou torna-se menor, ao outro sobra uma saudade que ninguém sabe como deter.
saudade é basicamente não saber.
não saber mais se ele continua fungando num ambiente mais frio.
não saber se ele continua sem fazer a barba por causa daquela alergia.
não saber se ele ainda usa aquela calça.
não saber se ele foi na consulta com o nefrologista como prometeu.
não saber se ele tem comido bem por causa daquela mania de estar sempre ocupado; se ele tem assistido às aulas de inglês, se aprendeu a entrar na internet e encontrar a página do diário oficial;
se ele aprendeu a estacionar entre dois carros; se ele continua preferindo malzebier; se ele continua preferindo suco; se ele continua sorrindo com aqueles olhinhos apertados; se ele continua dançando daquele jeitinho enlouquecedor;
se ele continua cantando tão bem; se ele continua detestando o mc donald’s;
se ele continua amando; se ele continua a chorar até nas comédias.
saudade é não saber mesmo!
não saber o que fazer com os dias que ficaram mais compridos; não saber como encontrar tarefas que lhe cessem o pensamento; não saber como frear as lágrimas diante de uma música; não saber como vencer a dor de um silêncio que nada preenche.
saudade é não querer saber se ele está com outro, e ao mesmo tempo querer.
é não saber se ele está feliz, e ao mesmo tempo perguntar a todos os amigos.
é não querer saber se ele está mais magro, se ele está mais belo.
saudade é nunca mais saber de quem se ama, e ainda assim doer…
saudade é isso que senti enquanto estive escrevendo
e o que você, provavelmente, está sentindo agora, depois que acabou de ler."

...

postando e ouvindo: nassira e najaf - karina buhr


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